domingo, 30 de março de 2008
O teu riso
Tira-me o pão,
se quiseres,
tira-me o ar,
mas não
me tires o teu riso.
Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.
A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe o céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.
Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.
À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosada minha pátria sonora.
Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.
Pablo Neruda
se quiseres,
tira-me o ar,
mas não
me tires o teu riso.
Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.
A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe o céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.
Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.
À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosada minha pátria sonora.
Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.
Pablo Neruda
Por vezes
E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos, E por vezes
Encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos.
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes.
Ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos.
E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se envolam tantos anos.
David Mourão-Ferreira
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos, E por vezes
Encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos.
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes.
Ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos.
E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se envolam tantos anos.
David Mourão-Ferreira
segunda-feira, 17 de março de 2008
Múrmurio
Traz-me um pouco das sombras serenas
que as nuvens transportam por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas,
- vê que nem te peço alegria.
Traz-me um pouco da alvura dos luares
que a noite sustenta no teu coração!
A alvura, apenas, dos ares:
- vê que nem te peço ilusão.
Traz-me um pouco da tua lembrança,
aroma perdido, saudade da flor!
- Vê que nem te digo - esperança!
- Vê que nem sequer sonho - amor!
Cecília Meireles
que as nuvens transportam por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas,
- vê que nem te peço alegria.
Traz-me um pouco da alvura dos luares
que a noite sustenta no teu coração!
A alvura, apenas, dos ares:
- vê que nem te peço ilusão.
Traz-me um pouco da tua lembrança,
aroma perdido, saudade da flor!
- Vê que nem te digo - esperança!
- Vê que nem sequer sonho - amor!
Cecília Meireles
Cinco Coisas
Quero apenas cinco coisas...
Primeiro é o amor sem fim,
A segunda é ver o outono,
A terceira é o grave inverno,
Em quarto lugar o verão,
A quinta coisa são teus olhos...
Não quero dormir sem os teus olhos.
Não quero ser... sem que me olhes.
Abro mão da primavera para que me continues a olhar.
Pablo Neruda
Primeiro é o amor sem fim,
A segunda é ver o outono,
A terceira é o grave inverno,
Em quarto lugar o verão,
A quinta coisa são teus olhos...
Não quero dormir sem os teus olhos.
Não quero ser... sem que me olhes.
Abro mão da primavera para que me continues a olhar.
Pablo Neruda
domingo, 16 de março de 2008
Pescadora de Sonhos
Sou pescadora de sonhos,
E ando pelo mar,
Ocupo um barco velho,
Sempre que vou navegar.
Quando tem a vela rasgada,
Avanço a derivar,
Sempre à procura de um sonho,
Que me queira acompanhar.
Quando o mar está revolto
Fico em terra a desfrutar,
Do cheiro das saudades das ondas,
Em que me deixo embalar.
Quando o mar está calmo,
Fico no barco deitada a sonhar,
A viver e a devorar o sonho,
Que acabei de pescar.
E ando pelo mar,
Ocupo um barco velho,
Sempre que vou navegar.
Quando tem a vela rasgada,
Avanço a derivar,
Sempre à procura de um sonho,
Que me queira acompanhar.
Quando o mar está revolto
Fico em terra a desfrutar,
Do cheiro das saudades das ondas,
Em que me deixo embalar.
Quando o mar está calmo,
Fico no barco deitada a sonhar,
A viver e a devorar o sonho,
Que acabei de pescar.
Existe
Há momentos em que te consigo ver,
É nesses momentos que sinto prazer,
Há momentos que te posso sentir,
E nesses momentos só posso sorrir.
Há dias em que sei és feliz,
E nesses dias sou feliz também,
Há dias em que a sombra não se contém,
E nesses dias tudo se contradiz.
Há horas em que sei falar,
E nessas horas sei o que quero contar,
Há horas em que não me consigo calar,
É nessas horas que tenho medo de me expressar.
Há segundos em que quero duvidar,
E nesses segundos não sei como querer,
Há segundos que procuro entender,
É nesses segundos que me sinto a ceder.
É nesses momentos que sinto prazer,
Há momentos que te posso sentir,
E nesses momentos só posso sorrir.
Há dias em que sei és feliz,
E nesses dias sou feliz também,
Há dias em que a sombra não se contém,
E nesses dias tudo se contradiz.
Há horas em que sei falar,
E nessas horas sei o que quero contar,
Há horas em que não me consigo calar,
É nessas horas que tenho medo de me expressar.
Há segundos em que quero duvidar,
E nesses segundos não sei como querer,
Há segundos que procuro entender,
É nesses segundos que me sinto a ceder.
domingo, 9 de março de 2008
sexta-feira, 7 de março de 2008
Tempo
Nunca é tarde
Uma pessoa que é gente, homem, mulher.
Amar, sonhar, olhar, zangar
Uma outra vez
Largar começar
Contar a quem passar que o
Ontem não interessa recordar
Estranha fruta encontrada no chão de uma casa onde gente
Grande, pequena espera, sabe-se lá,
Talvez vida, outro, não se viu falar,
Tempo, porque?
Olhos na televisão pés na mesa,
Sombras nas sombras, nada e tudo. Mudar...
Tudo tudo tudo
Esperar o tempo
Mostrar
Gente
Renascer e viver
Amar, sonhar, olhar, zangar
Uma, outra vez
Largar...começar
José E. Abreu
Uma pessoa que é gente, homem, mulher.
Amar, sonhar, olhar, zangar
Uma outra vez
Largar começar
Contar a quem passar que o
Ontem não interessa recordar
Estranha fruta encontrada no chão de uma casa onde gente
Grande, pequena espera, sabe-se lá,
Talvez vida, outro, não se viu falar,
Tempo, porque?
Olhos na televisão pés na mesa,
Sombras nas sombras, nada e tudo. Mudar...
Tudo tudo tudo
Esperar o tempo
Mostrar
Gente
Renascer e viver
Amar, sonhar, olhar, zangar
Uma, outra vez
Largar...começar
José E. Abreu
quinta-feira, 6 de março de 2008
Caminho
Marca bem a tua estrada,
Para que a possa seguir,
Traça o meu caminho,
Não me faças desistir.
Sem estradas sinuosas,
Sem descidas vertiginosas,
Sem manobras perigosas,
Sem árvores tenebrosas.
Marca fundo as tuas pegadas,
Para que não as consiga perder,
Por mais alto que a maré suba,
Que nunca deixe de as ver.
Sem pressa de chegar,
Sem lembranças para carregar,
Sem histórias para arrastar,
Apenas tu, a areia e o mar.
Para que a possa seguir,
Traça o meu caminho,
Não me faças desistir.
Sem estradas sinuosas,
Sem descidas vertiginosas,
Sem manobras perigosas,
Sem árvores tenebrosas.
Marca fundo as tuas pegadas,
Para que não as consiga perder,
Por mais alto que a maré suba,
Que nunca deixe de as ver.
Sem pressa de chegar,
Sem lembranças para carregar,
Sem histórias para arrastar,
Apenas tu, a areia e o mar.
quarta-feira, 5 de março de 2008
Mudanças
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.
Luís Vaz de Camões
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.
Luís Vaz de Camões
Nada
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Fernando Pessoa
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Fernando Pessoa
LXXIX
De noite, amada, prende o teu coração ao meu
E que no sono eles dissipem as trevas
Como um duplo tambor combatendo no bosque
Contra o espesso muro das folhas molhadas.
Nocturna travessia, brasa negra do sono
Interceptando o fio das uvas terrestres,
Com a pontualidade de um comboio desvairado
Que sombra e pedras frias sem cessar arrastasse.
Por isso, amor, prende-me ao movimento puro,
À tenacidade que em teu peito bate
Com as asas de um cisne submerso.
Para que às perguntas do céu
Responda o nosso sono com uma única chave,
Com uma única porta fechada pela sombra.
Pablo Neruda
E que no sono eles dissipem as trevas
Como um duplo tambor combatendo no bosque
Contra o espesso muro das folhas molhadas.
Nocturna travessia, brasa negra do sono
Interceptando o fio das uvas terrestres,
Com a pontualidade de um comboio desvairado
Que sombra e pedras frias sem cessar arrastasse.
Por isso, amor, prende-me ao movimento puro,
À tenacidade que em teu peito bate
Com as asas de um cisne submerso.
Para que às perguntas do céu
Responda o nosso sono com uma única chave,
Com uma única porta fechada pela sombra.
Pablo Neruda
terça-feira, 4 de março de 2008
Perfeito
Como uma dança, onde a música é a voz,
Convertem-se movimentos leves, subtis, insinuantes,
Onde por vezes rodopiares inconstantes,
Deixam acreditar que quem a comanda somos nós.
De noite à luz das estrelas, de dia ao som do mar,
Dançamos entre raios de sol, oscilamos ao luar,
Tecemos um futuro distante, desejamos um momento,
Que entre contradanças partilhe, em surdina um sentimento.
Flutuando entre sorrisos, com leveza pelo ar,
Tranquilizamos o suspiro que nos faz hesitar,
Sem medo de um salto, que nos leve a quebrar.
E com desvios irrequietos, em forma de aproximação,
Querendo retomar a dança voltamos a dar a mão,
Com um destino incerto, ao ritmo do coração.
Convertem-se movimentos leves, subtis, insinuantes,
Onde por vezes rodopiares inconstantes,
Deixam acreditar que quem a comanda somos nós.
De noite à luz das estrelas, de dia ao som do mar,
Dançamos entre raios de sol, oscilamos ao luar,
Tecemos um futuro distante, desejamos um momento,
Que entre contradanças partilhe, em surdina um sentimento.
Flutuando entre sorrisos, com leveza pelo ar,
Tranquilizamos o suspiro que nos faz hesitar,
Sem medo de um salto, que nos leve a quebrar.
E com desvios irrequietos, em forma de aproximação,
Querendo retomar a dança voltamos a dar a mão,
Com um destino incerto, ao ritmo do coração.
Se tu me esqueces
Quero que saibas
Uma coisa
Tu sabes como é:
Se contemplo a lua de cristal, os ramos rubros
Do Outono lento da minha janela,
Se toco
Ao pé do lume
A implacável cinza
Ou o corpo enrugado da lenha,
Tudo a ti me conduz,
Como se tudo o que existe,
Aroma, luz, metais,
Fossem pequenos barcos que navegam
Em direcção às tuas ilhas que me esperam.
Ora bem,
Se a pouco e pouco deixas de amar-me,
Deixarei de amar-te a pouco e pouco.
Se de repente
Me esqueceres,
Não me procures,
Que já te haverei esquecido.
Se consideras longo e louco
O vento de bandeiras
Que percorre a minha vida
E decidires deixar-me à margem
Do coração em que tenho raízes,
Pensa
Que nesse dia,
Nessa hora,
Levantarei os braços
E as minhas raízes irão
Procurar outra terra.
Mas
Se em cada dia,
Em cada hora,
Sentes que a mim estás destinada
Com doçura implacável.
Se cada dia em teus lábios
Nasce uma flor que me procura,
Aí, meu amor, ai minha,
Todo esse fogo em mim se renova,
Em mim nada se apaga nem se esquece,
O amor do teu amor se nutre, amada,
E enquanto viveres continuará nos teus braços
Sem abandonar os meus.
Pablo Neruda
Uma coisa
Tu sabes como é:
Se contemplo a lua de cristal, os ramos rubros
Do Outono lento da minha janela,
Se toco
Ao pé do lume
A implacável cinza
Ou o corpo enrugado da lenha,
Tudo a ti me conduz,
Como se tudo o que existe,
Aroma, luz, metais,
Fossem pequenos barcos que navegam
Em direcção às tuas ilhas que me esperam.
Ora bem,
Se a pouco e pouco deixas de amar-me,
Deixarei de amar-te a pouco e pouco.
Se de repente
Me esqueceres,
Não me procures,
Que já te haverei esquecido.
Se consideras longo e louco
O vento de bandeiras
Que percorre a minha vida
E decidires deixar-me à margem
Do coração em que tenho raízes,
Pensa
Que nesse dia,
Nessa hora,
Levantarei os braços
E as minhas raízes irão
Procurar outra terra.
Mas
Se em cada dia,
Em cada hora,
Sentes que a mim estás destinada
Com doçura implacável.
Se cada dia em teus lábios
Nasce uma flor que me procura,
Aí, meu amor, ai minha,
Todo esse fogo em mim se renova,
Em mim nada se apaga nem se esquece,
O amor do teu amor se nutre, amada,
E enquanto viveres continuará nos teus braços
Sem abandonar os meus.
Pablo Neruda
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